Conquistamos nossos direitos iguais!
Queimamos sutiãs, amarramos nossos seios, apertamos nossos quadris e corremos atrás de um padrão de beleza de mulheres travestis: altas, de poucos seios, maxilares avantajados e quadris estreitos.
Ao conquistarmos tudo aquilo que cem anos foram suficiente para engolirmos o mercado de trabalho, falarmos os palavrões e , deglutirmos o sexo oposto com uma independência testosterônica, nós mulheres, esquecemos de parir. Crianças são expelidas às pressas para que a maquiagem não fique borrada, e logo são delegadas ao cuidados de outras paridas rápidas e parideiras Express, que deixaram os seus paridos à jato aos cuidados de outras pós-paridas.
Não sabemos mais o que é parir, nem mesmo o que é gerar. Não dá mais tempo para esperar aquela barriga ficar enorme. Perde-se a forma, ganha-se o peso e a sensação de que estamos sempre perdendo alguma coisa profissionalmente fica alarmante. - Que horas você quer que ela nasça? Pergunta a médica olhando para o relógio e balançando as pernas debaixo da mesa do consultório. - Pode ser agora? Já trouxe até o espartilho!
Mulheres desesperadas correm para cursos de pré-natal para aprenderem como é que se tem um filho. Curso de amamentação. De dar banho no filhinho. Curso de pai. De mãe e de avó. Curso de entender o que é que você terá que entender. As mães não são mais avós. Não temos mais a tradição oral, a sabedoria familiar, tribal, que repassa a experiência com maestria. É como os médicos de hoje, que não sabem mais fazer parto. Morrem de medo de um parto natural, normal! Nor-mal. Tem esse nome por que era normal. Hoje o normal é cortar o buxo, puxar logo pra fora, costurar e vamos nessa. - Mas eu quero ter normal, repete uma dê modê... me desculpe, mas por motivos pessoais, eu não trabalho com parto normal. E a ladainha se repete consultórios a fio. Os profissionais que antes tinham tempo para estudar e acompanhar seus pacientes, e tinham tempo para esperar que mais um milagre acontecesse agora se fizeram Deus, dono do milagre e do tempo.
- Mas eu quero normal, insiste a louca dê modê. Terá que pagar caro, e mesmo assim os hospitais olharão para você com cara de quem é um indigente. Mas ela vai lá, paga mais caro, corre atrás do sonho, que mais a frente será despedaçados por uma herança de hábitos de vida tecnológicos que impossibilitaram a passagem do bebê pelo quadril. Não teve dilatação. Mulheres de quadris largos, atletas, contorcionistas, todas elas se espantam ao verem seus templos desmoronarem e não funcionarem como deviam. Índias mignons se espremem no mato e o choro rasga o céu abençoado. Suas rotinas diárias permitem que elas se acocorem com freqüência, caminhem, sentem no chão, enquanto as civilizadas apertam os controles remotos e alarmes de seus carros.
Ao conquistarmos todos os espaços masculinos, realizamos cinco jornadas de trabalho e desejamos que todas saiam com perfeição. Levantamos às 6 da manhã para malharmos na academia e termos o corpo do travecão. Damos o café do filinho às 8h cumprindo o dever de mãe e jogamo-lo numa vã que o levará para uma excelente escola integral, com oito horas da mais pura produção. Almoçamos com nossos amores num restaurante executivo ao meio dia, compramos o sabão em pó para a empregada no fim da tarde e passamos muito creme a noite. E nunca estamos satisfeitas. Temos que ter mais tempo para malhar e trabalhar.
Ao deixarmos nossa mulher morrer, nossa criatividade seca junto com nosso leite de três meses. Nesse caldo estragado quem sai perdendo somos nós mesmas, mulheres. Sem saber onde colocar as mãos, os homens se afastam e olham de longe essa selvageria. Querem cuidar mas não tem de quem. Querem proteger mas não tem do quê. Querem saborear mas só tem em comprimidos. Assim se escondem no próprio sexo, ou ficam em cima do muro, esperando um dia sejam compreendidos sem serem vaiados.
Enquanto isso nossos pequenos projetos pré-moldados vão ficando cada vez mais sem referencial emocional, cultivando um vazio infinito dentro do peito e passando de mão em mão, em educações duvidosas e formações medíocres. Não sabendo o que fazer com seus corações ao vácuo procuram aprovação agressivas e dilacerantes e assim constroem a baderna.
Não é a falta da mãe medonha. É a falta do carinho, do muitos beijos e muito amor. Não é da mãe que devora. É da mãe que liberta ao dedicar-se um brilho do seu dia a viver intensamente aquela vida que quer ser vivida com segurança para poder voar. É poder criar, cavar a terra, acompanhado daquilo que só foi cortado fisicamente, que é o seu cordão do umbigo.
Deixe que o pai traga as frutas. Deixe que o mundo gire mais rápido. Aproveite para se gerar novamente e coloque tudo que há de mais criativo para fora, assim como fez ao brotar um novo coração de você. Não se perca no sonho dos outros, alheios. Permita que o presente te permeie mais uma vez, acompanhando o grito que te encrava na terra. Torne essa jornada sadia e proveitosa, amando os pequenos dedinhos, os olhinhos brilhantes, as surpresas desajeitadas.
Deixe que o outro, no sentido masculino mesmo, te cuide, te proteja e proteja a tua cria. Alimente a tua alma e cultive assim um mundo mais feliz. O tempo resgata o que terá de vir, para quem acredita.