quinta-feira, 28 de março de 2013

EM DOR DE TRANSFORMAÇÃO



Não adianta
A chuva irá cair, independente do querer
Todos os dias de lastros serão secos
De tão pesado foi teu firme

Nem adianta imaginar que será diferente
A pupa da borboleta acontece
Mesmo que ela, a lagarta, não queira

A transformação é inevitável
Vez como raio e trovão
Vez como maré que enche

Não adianta...

Em tempo de mudança
A terra fecha seus corpos
Em noites enluaradas
E as estrelas continuam a girar

O dia chegará diferente
Com outros raios
Que vieram de distante direção
Para aquecer seu barco
Como a madeira que é feito
Precisa na medida do não rachar

Dias de chuva virão
E tua relva crescerá novamente

As flores estarão a colorir
Todas as glórias do seu sorriso

quarta-feira, 27 de março de 2013

O Sentido do Gosto

Pele poro
Gosto sente
Cada entranha
Complacente

O gosto norte, pra quê caminho?
O gosto sorte
De vento a espinho

Constelar


Preciso de uma novidade que parta do céu
Não pode ter forma ou formato já conhecido
Tem que ter escrúpulo, mas não-norma
Tem que ser surpreendentemente simples
Como brisa de mar

Não dá pra ser empoeirado
Empetrado
Não pode ser singelo em demasia
Muito menos inofensivo

Tem que ser avesso
Esfolado
Não dá pra ser medido, mentido, fingido, encenado

Parto do particular
De que cada partícula deve ser improvisada
Cada célula
Alucinada de uma série de verdades impróprias
Clarificante
Um basta às loucuras instituídas

Quero uma imagem do revolucionário
Nada descritivo
Uma imagem desfigurada
Mais doce do que se imagina
 Mais pé-no-chão do que se espera
Mais natural do que se pretenda pertencer

Uma novidade de força
Aguda
Como um parto no mato
Um menino recém-nascido
Ceifado pelo traço do umbigo
A abertura de novos corações, de outras sintonias
De uma força
 De um poder
Ancestral demais para ser compreendido.




Amor em Vereda


Ali tão simples
Em lugar frágil e essencial
Horizonte espichado
Espregiça todo o amor

Veredas tenras
Com seus fortes Buritis

Ali
Onde brotam as águas límpidas
A liberdade faz alma
O silêncio é conversa de outros seres
E labareda, dança de menina arteira,
é o querer do recriar

Ali tão simples
O vento escreve
Que não demais e nem de menos
Se pode sentir
Amor tão pleno

Bem perto ali
Na natureza do seu coração

O CAIR DA FLOR


Quando a flor se cai em lapso
De madura ou de cumprida
É o estado de fecunda
Que hora vinga flor bonita

É o despir-se de sensato
Novos ares a servir
Como a mãe durante o parto
Novo ser a expelir

Linda flor não é se foi
Matéria orgânica a diluir
Sua madura etérea flor
De adubo vai vestir

Nas raízes de outras relvas
Essa flor está a nutrir
Mas o corpo agora é fruta
Fresca fruta a deglutir

Tão perfeita é a flor
A fruta e o seu nutrir
Como tão perfeita é a dor
Do amor, crescer, amadurecer e então despir


sábado, 16 de março de 2013

Amnésia

Por favor, se afaste!
Hoje saí de saia etílica.
Não há forma mais lasciva.
Minha gira vai girar.

Por favor, não negue.
Minha pele é vibrante
Mesmo estando tão distante
A Serpente cortante
Irá te penetrar

Por favor, me ouça
Hoje eu não sou de louça
Esqueça aquela moça
Essa é a hora de brincar

Por favor, esqueça
Hoje a noite é labareda
Na varanda ou na vereda
Não terá como se negar

Agora dá licença,
Não é hora de pedir
Quanto venho vai dormir
A que quer me limitar

Olha a gira, tá girando
Você vai se acostumando
O corpo está voltando
A querer o que negar

Quando a cana é caiana
Os lábios não são mais de seda
É a vez da carrapeta
Lamber, incendiar

Agora tudo inflama de vontade.
Os olhos brilhantes são da outra metade
Não adianta tempestade
Ela irá se saciar

A fera é cega
Então se entrega
Ela não dará mais trégua
Irá ter que ganhar

Flor na cabeça, ela tá linda
Gira a saia, gira a gira
Serpente vermelha 
Gira-gira
Flor na cabeça 
Gira-gira
Flor de deitar

Muitos espasmos
dão-me os espaços vazio
que tenho dentro de mim.

Em sobressaltos de cavalos
estalam minhas juntas,
todas imundas - imundas juntas-
que me marcam assim.

Quero voar bem alto,
ficar mais leve.
Mas os espaços vazios
são os que mais pesam
Não há o que se fazer


O vazio é vazio.
É o incontrolável,
O inquestionável,
O incompreensível,
O que não há.

Se mergulho me afogo;
Se voo me perco;
Se fico, sobro.

Por todos os lados que procuro,
só vejo o escuro.
Pois tudo me faz cercar,
Que me faz escudar,
está contido no vazio.

Não me ligo
Não me prendo
Não me importo
Não respiro

Eu tento
Eu lemento
Eu, minto
Eu sinto
Eu morro e eu me mato,
E eu não sei se lamentável, mas eu sempre sobrevivo.


domingo, 22 de julho de 2012

Do sofrer de tanto amar


Quando a vi pela primeira vez, ela era um pulso, rápido, latente, tão incoerente que eu não entendi.
Na segunda vez que a vi ela era azul. Nasceu no dia do meu dia e eu ainda não entendia como que meu coração pulsava fora de mim.
Na terceira vez, ela me olhava brilhante. Grudou no meu peito e dali em diante, finalmente, entendi. Eu não tinha mais controle nem compreensão de nada. Não sabia mais qu...em era eu, e tudo que eu sentia era gerado por ela.
Imaginem: sentir pelo coração do outro é viver uma superaventura fora do seu corpo.
É como essa nova invenção de duplicação de átomo, onde tudo que se faz num reflete exatamente igual no outro. Mas o difícil é imaginar que a reflexão no outro não é igual, porque o outro já viveu. Então, é muita emoção, porque o outro sabe que a escada é alta, o tombo é feio, e que a doçura daqueles olhos é adimensional. Chora-se de alegria, de preocupação, de encanto, de amor. Viver-se numa corda bamba, ligada pelo umbigo, sabendo que a cada dia que se ama mais, mais se chega perto do fim. Que a cada dia que aquela mãozinha cresce, mais próximas estamos da emancipação desse serzinho que vai virar gente grande, e vai querer correr o mundão de preferencia bem longe de você.
Ser mãe é, por assim dizer, sofrer de tanto amar. E saber, que o ir embora sem abandono, muitas vezes, é sinal de que o amor foi saudável.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A Virada


A virada foi assim
O cão de dois metros esquivo, por motivos artifícios, dentro do quarto
Elas de vestidos brancos ou beges, todos com o mesmo tecido
Eles com goles entre conversas
Pensamentos de amor e chuvas prateadas
Muita música, que o corpo conversa com a alma também
E no dia seguinte, as esperanças renovadas, apesar do tom etílico dos olhos, herança de um ano que se passou

sábado, 13 de agosto de 2011





Era um palhaço, tinha sessenta.

Suas bochechas eram grandes e flácidas. Não tinha mais dentes.

Chorava, enquanto todo mundo sorria.

Era um palhaço, tinha trinta.

Suas bochechas eram salientes e firmes. Tinha a boca repleta de dentes.

Sorria e fazia todo mundo chorar.

Era um palhaço, tinha três.

Suas bochechas eram grandes e firmes. Ainda não tinha todos os dentes.

Amava e o mundo não compreendia.


















terça-feira, 7 de junho de 2011

Oração

Que todos os dias pareçam feriado
Que o mundo tenha a ternura do seu abraço
Que toda criança possa sentir o cheiro dos doces de tardes sem fim
Que a chuva caia onde a água seja benção
E onde o verde implore o azul
Que seu sorriso despentei a minha trança
Que a solitude seja uma prece
Que o silêncio seja perturbado pela algazarra dos ventos de areia
Que o violeta da espuma marinha amacie os meus pés, e os seus também
Que todas as estrelas sintam-se estrelas
Que tudo seja passageiro
E que a passagem não seja tão cara
Que o amor permeie sua casa
A minha
Dos meus e dos teus irmãos
Que acorde todos os dias esfregando os pés nos pés de alguém
Que um dia morte chegue
E que o tempo continue sendo curandeiro
Pra levar as dores dos que ficam
E alegrar a alma dos que se foram!

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Da Série Maria

Estamos vivendo momentos de correria
De crenças e descrenças,
De rupturas,
De muitos e de poucos referenciais
Em meio a toda essa corrente turbulenta
Onde hora damos nossas maiores braçadas
Hora nos entregamos à corrente da maré
Encontro Maria tranqüila,
Experimentando e experiênciando as forças das águas sem pavor
Encontro Maria se encontrando, se reencontrando, inventando e reinventando
Nossa alegria fica no ar, no ambiente de nossos corações
Permissão para sonhar...
Tropeçando em miúdos ruídos
Tentamos delicados, armar nossas redes de sonhos
Que nos alertam serem impossíveis
Mas como seria possível viver sem sonhar?
Diante de Maria, os olhos brilhantes
Não se apagam em sombras de relâmpagos
Voamos sim, alto
Mas temos a sensação de estarmos cada vez mais perto do nosso chão
Porque Maria é ilha continental
E esse nosso, esse somos, esse "nós", sou eu em você e você no outro e em mim
Essa janela, esplendida, que se abriu de mim para ti
Não pode mais se fechar
Poderá somente passar de janela para porta
E de porta para clarão
Garças a Maria, descobri o nome do que conhecia
Mas não sabia nomear
E nem sabia que outros sabiam
A "terceira entidade"
Achei Maria Flor.

Pra Maria

O que significa isso?

Como podes entrar assim
Arrombando a relva

Dilacerando os astros?

Como te permites, sem me perguntar
Colocar-se ao meu lado em ampulheta?

Me fazer café e pão?
E leite,claro, sempre leite?

Como ousas fazer crescer meus medos?
Irritar minha imaginação?
Desafiar meus limites
Confiar mais nas minhas crenças
Sentir-me tão pequena ao ponto de não saber mais falar nenhuma língua?

O que aconteceu antes de ti?
Quem eu era e que ainda nem sei quem sou
Porque através de espelhos
Multifaceados
Me encontro refletida nos teus olhos
Líricos
Lírios
Dálicos

Por que me entregas-te assim
De mão beijada
Aos pés de sua imensidão?

Como faço eu agora
Para não ser feliz de vez em quando
Para não sentir culpa ao reclamar
Para me olhar no tempo
No espaço
Nas circunsâncias
E somente enxergar você?

O que será de mim agora que descubri
Que nunca fui
O que era antes e
Jamais serei o que sou agora
Porque você me povoou
Me repartiu
Me esfarelou

Meu pôr do sol são suas falas
Minha descencia a sua alma
Minha alegria
Tuas risadas
E tuas mãos
O meu lençol

Não falo nada que não te caiba
Minha voz agora é água
Que rega as amoras
Da sua vida

Você é minha oração
Meu templo
Minha reza
Minha comida
Minha única artéria

Só pinto os olhos pra te mostrar
Como bonita tu me fazes a vida

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Carne de Sol

Não quero que entre por meus olhos
Quero absorver-te hermética,
Sugado pelo umbigo
Não quero que chupe meus joelhos
Nem que me engula em saliva
Quero que cuspa o teu ventre
E que excrete a espinha dorsal
Colossal
Num prato raso, de barro cozido
Não aceito pontuação
Em minha pele ardida
Meu humor cachaça
Exala sorriso suado
Quero regaço al dente
Pimenta vermelha na orelha
Ao sol exposta a carne frescade minha flor dália
Secará salgada pelo ardor de todo teu despudor

Rapadura

Toda minha raspa doce é dura
Esquenta ao sol
Derrete
Perdura
E depois, novamente, a rapa fica dura
Toda minha dura raspa é doce
Perdura
Derrete
Esquenta ao sol
E depois, novamente, doce rapa dura

Do que Preciso

Vou dizer do que preciso:
De dias mais quentes de pessoas
De vozes mais cheias de compromisso
De olhos mais doces
De muitos risos
Preciso de seus sonhos
E dos meus também
Preciso das viagens
De reciclagem
De bons ouvidos
Preciso de muitos abraços
De sorrisos largos
De grandes olhos curiosos
De pés pequenos que crescem diariamente
De verdades amorosas
Escrever
Ler
Dançar
Preciso expressar
Contactar
Encenar
Desafiar
Existir por existir
Olhos nos olhos
Corpos a luz de velas
Candelas
Música boa
Comida bem feita
Chocalhos na canela
Negritude na veia
Preciso da candeia
De ser seria
Nos rios do mar
E desaguar serena
Nas açuncenas
Do meu doce lar
Como é bom voltar

Do meu Eu em Clarice

Eu me abro em você.
Me procuro, me acho e me perco, e me sinto dilacerada, crua e exposta,mas eternamente reconhecida nas suas entranhas.
Você me fascina desde o meu início.
Te abro, me calo onde nos encontro e te venero.

Do Carnaval

No carnaval
A carne é Val
Eu tava tinta
Fresca
Linda

No carnaval
É tudo sopro
Tinha cachaça
Eu tava rosa
Prosa
Purpurina

No carnaval
Tinha gracinhas
Eu tava brilho
Pernas
Cílios

No carnaval
A coisa é quente
Tinha suor
E muita gente
Eu tava rasa
Eu tava risos
Carambola
Esquivos

No carnaval
Eu tava aberta
Eu tava certa
Que tava vindo

No carnaval
A carne é Val
E toda fantasia
Com a amnésia
Se torna fria
No fim dos dias
De carnaval

Do não querer-te

Não quero mais seus dedos escorrendo nos ares da minha vista
Sua boca que cospe palavras sangrias
Seus poros ácidos que derretem sobrecarregadas sobrancelhas
Ver sua história crescendo em pele
Suas marcas azedas deixadas na minha cidade
Suas cinzas de borras queimadas
De todas as coisas que se expressam
Mas que não se refletem em você
Não sou tão dura quanto queres
Nem tão seca como idealiza
Não sou tão certa, nem tão reta, nem tão limpa
Ou Carregada de cultura e consciência
Não sou política
Nem sou atriz
Sou aquilo que chamo de mim
Que não pode ter um nome
Não quero mais
Ver você me querer pequena
Vedada
Num lastro de vidro
Onde os sons não chegam
As pessoas não olham
O calor não afeta
E os cigarros são ilícitos
Eu quero o barulho
O suor das risadas
Ou porque então eu sairia de mim numa noite abafada?

Eda

Penso em teus olhos no horizonte
Tão perdidos e fixos na sua Sua realidade
Penso na tua forma de se segurar na vida
Tateando cigarros
Como se acariciasse perante a tua toda vida
Tua triste ida
Para ser coragem
porque ser coragem é viver
Teus erros
Espelhos nos outros
Teus óculos sentados
Escudos de ouro
Tua pele mais leve que teus encontros contigo
Os cabelos tão brancos e belos
Que era muito escura
a tua vista da vida
E você sempre forte
Eu queria saber onde você escondia tuas lágrimas
Queria encontrar tuas doçuras além de teus doces
Queria ver sua áurea amarela
Tuas cartas coloridas de mandalas
que era tão ácida
tua língua azeitada
e você sempre bela
teus pés agora mais novos
teu olhar assutado
eu não sei como pode ter sido isso
assim
um buraco que te sugou
levou teu fôlego
sem respeito
sem nada
não pediu licença e entrou de sopetão
e o pior do sofrimento não é o sofrimento
é a solidão do sofrimento
e meu choro é não poder estar do teu
eu queria dizer-te exatamente o contrário que te disse antes de ir
eu queira nunca ter conhecido a culpa
que você sempre me apresentou - ei-la aqui!
hoje te vejo não mais
hoje é ontem
o hoje será daqui pra frente sempre um ontem
e você estará lá longe
onde sempre nos questionamos em tardes frias
aos bolos de chuva. Café e baralhos
se existíamos ainda ou juntos ou longe ou no mesmo instante
Sua matéria será vaga luz
plena de incosciencia e criação
em algum momento nos encontraremos novamente
eu serei certamente mais limpa
mais nada

Das vaias

Sinto-me vaia.
Uma exposição de movimentos que não conquistaram.
Um esforço que tentou tirar aplausos, mas que não sucedeu.
Sinto-me vaia. E não porque não me gostaram.
Mas porque eu vaia, sou aquela que abate.
Porque meu eu desaprova minha conduta e aquela alheia.
Vaio o seu discernimento vazio.
Vaio sua conduta descompromissada com meus sentimentos.
Seus excessos de retóricas mal distribuídas.
Suas escusas impraticadas.
Minha vaia vai ao fundo do meu eco mais encarnado e sai como um vômito explodido.
Eu não quero mais o seu exposto,
Me escondo de suas mentiras,
Porque não suporto, sem dúvida
Não suporto, não poder conhecer seus dias.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Da sua pré-partida

As coisas vão...como uma tarde de chuva. Cheia de saudades.

domingo, 7 de junho de 2009

Do Aborto não quisto II

Um quase.

Do Aborto não quisto

O silêncio ensurdecedor que reverbera numa caverna fria e ifinita.

domingo, 29 de março de 2009

Da conquista dos direitos iguais

Conquistamos nossos direitos iguais!

Queimamos sutiãs, amarramos nossos seios, apertamos nossos quadris e corremos atrás de um padrão de beleza de mulheres travestis: altas, de poucos seios, maxilares avantajados e quadris estreitos.

Ao conquistarmos tudo aquilo que cem anos foram suficiente para engolirmos o mercado de trabalho, falarmos os palavrões e , deglutirmos o sexo oposto com uma independência testosterônica, nós mulheres, esquecemos de parir. Crianças são expelidas às pressas para que a maquiagem não fique borrada, e logo são delegadas ao cuidados de outras paridas rápidas e parideiras Express, que deixaram os seus paridos à jato aos cuidados de outras pós-paridas.

Não sabemos mais o que é parir, nem mesmo o que é gerar. Não dá mais tempo para esperar aquela barriga ficar enorme. Perde-se a forma, ganha-se o peso e a sensação de que estamos sempre perdendo alguma coisa profissionalmente fica alarmante. - Que horas você quer que ela nasça? Pergunta a médica olhando para o relógio e balançando as pernas debaixo da mesa do consultório. - Pode ser agora? Já trouxe até o espartilho!

Mulheres desesperadas correm para cursos de pré-natal para aprenderem como é que se tem um filho. Curso de amamentação. De dar banho no filhinho. Curso de pai. De mãe e de avó. Curso de entender o que é que você terá que entender. As mães não são mais avós. Não temos mais a tradição oral, a sabedoria familiar, tribal, que repassa a experiência com maestria. É como os médicos de hoje, que não sabem mais fazer parto. Morrem de medo de um parto natural, normal! Nor-mal. Tem esse nome por que era normal. Hoje o normal é cortar o buxo, puxar logo pra fora, costurar e vamos nessa. - Mas eu quero ter normal, repete uma dê modê... me desculpe, mas por motivos pessoais, eu não trabalho com parto normal. E a ladainha se repete consultórios a fio. Os profissionais que antes tinham tempo para estudar e acompanhar seus pacientes, e tinham tempo para esperar que mais um milagre acontecesse agora se fizeram Deus, dono do milagre e do tempo.

- Mas eu quero normal, insiste a louca dê modê. Terá que pagar caro, e mesmo assim os hospitais olharão para você com cara de quem é um indigente. Mas ela vai lá, paga mais caro, corre atrás do sonho, que mais a frente será despedaçados por uma herança de hábitos de vida tecnológicos que impossibilitaram a passagem do bebê pelo quadril. Não teve dilatação. Mulheres de quadris largos, atletas, contorcionistas, todas elas se espantam ao verem seus templos desmoronarem e não funcionarem como deviam. Índias mignons se espremem no mato e o choro rasga o céu abençoado. Suas rotinas diárias permitem que elas se acocorem com freqüência, caminhem, sentem no chão, enquanto as civilizadas apertam os controles remotos e alarmes de seus carros.
Ao conquistarmos todos os espaços masculinos, realizamos cinco jornadas de trabalho e desejamos que todas saiam com perfeição. Levantamos às 6 da manhã para malharmos na academia e termos o corpo do travecão. Damos o café do filinho às 8h cumprindo o dever de mãe e jogamo-lo numa vã que o levará para uma excelente escola integral, com oito horas da mais pura produção. Almoçamos com nossos amores num restaurante executivo ao meio dia, compramos o sabão em pó para a empregada no fim da tarde e passamos muito creme a noite. E nunca estamos satisfeitas. Temos que ter mais tempo para malhar e trabalhar.

Ao deixarmos nossa mulher morrer, nossa criatividade seca junto com nosso leite de três meses. Nesse caldo estragado quem sai perdendo somos nós mesmas, mulheres. Sem saber onde colocar as mãos, os homens se afastam e olham de longe essa selvageria. Querem cuidar mas não tem de quem. Querem proteger mas não tem do quê. Querem saborear mas só tem em comprimidos. Assim se escondem no próprio sexo, ou ficam em cima do muro, esperando um dia sejam compreendidos sem serem vaiados.
Enquanto isso nossos pequenos projetos pré-moldados vão ficando cada vez mais sem referencial emocional, cultivando um vazio infinito dentro do peito e passando de mão em mão, em educações duvidosas e formações medíocres. Não sabendo o que fazer com seus corações ao vácuo procuram aprovação agressivas e dilacerantes e assim constroem a baderna.
Não é a falta da mãe medonha. É a falta do carinho, do muitos beijos e muito amor. Não é da mãe que devora. É da mãe que liberta ao dedicar-se um brilho do seu dia a viver intensamente aquela vida que quer ser vivida com segurança para poder voar. É poder criar, cavar a terra, acompanhado daquilo que só foi cortado fisicamente, que é o seu cordão do umbigo.

Deixe que o pai traga as frutas. Deixe que o mundo gire mais rápido. Aproveite para se gerar novamente e coloque tudo que há de mais criativo para fora, assim como fez ao brotar um novo coração de você. Não se perca no sonho dos outros, alheios. Permita que o presente te permeie mais uma vez, acompanhando o grito que te encrava na terra. Torne essa jornada sadia e proveitosa, amando os pequenos dedinhos, os olhinhos brilhantes, as surpresas desajeitadas.
Deixe que o outro, no sentido masculino mesmo, te cuide, te proteja e proteja a tua cria. Alimente a tua alma e cultive assim um mundo mais feliz. O tempo resgata o que terá de vir, para quem acredita.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Da tua alegria em Mim

Teus olhos marejados deixavam teus cílios repletos de gotas cintilantes, como bolhas de sabão prestes a estourar. E tua alma gemia distante, dentro de uma alegria infinita.
Eu contemplava você sentada, tentado apenas existir, porque te ver ali, assim, era tão emocionante, que ficava difícil entender onde tudo começava.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Da Matéria dos Sonhos/ Ou Das Almas/ Ou Da Morte

Esquece o teu mal
E todo mal que há no mundo

Deixe que a cama aveludada penteie os teus cabelos
E que teu corpo espie o horizonte tranquilamente

O passado não passará de uma manhã ensolarada
E o futuro se cansará de ser uma madrugada em neblina

Permita que você se torne enfim
Uma tão desejada gota de orvalho
De um piscar matinal
Que refresca e perfuma um ordinário jardim florido

Assim ouvirás a eternidade
No frescor de uma doce brisa
Que te leva e te trás
Suavemente
Por paisagens de belezas inimagináveis e infinitas

E você será então
Apenas a matéria dos teu sonhos

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Do Delírio I

- O que vc está fazendo?
- Pescando olhos.
- E como faz isso?
- Pendura uma lua bem cheia na ponta de uma vara comprida e espera escurecer.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Da violência

Sem dúvida, o maior crime que a humanidade pode cometer sebre si mesma é qualquer tipo de violência contra a criança.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Do nascimento

Eu achava que a felicidade era uma coisa grande e que se encontrava num único lugar. Agora sei que a felicidade é bem pequeninha, mas que se encontra em todas as coisas.